Capa do Livro

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Quem sou eu

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Parobé, Rio Grande do Sul, Brazil
Kah Sykes = Maio de 1995, tattoos, cheese, coca cola, friends, sex, Bring me the horizon, Asking Alexandria, Falling In Reverse, A Day To Remember, Sleeping With Sirens, Pierce The Veil...

"Nunca pensei muito em como morreria,

Mas acho que morrer no lugar de alguém que eu amo

Seria uma boa maneira de partir."

Bella Swan – Crepúsculo

terça-feira, 24 de julho de 2012

4. Cuidados‎


Acordei confusa. Não sabia direito se a noite anterior foi um sonho ou se realmente aconteceu. Olhei no relógio, já era passado do meio dia. Meu pai já tinha saído para trabalhar, obviamente. Peguei o telefone e me sentei no sofá da sala. Eu queria ligar para ele, mas nem sabia ao certo o que dizer, eu nem sabia por que estava ligando, eu estava desesperada. Disquei seu número, o telefone começou a chamar, eu estava nervosa, comecei a torcer para que ele não atendesse.
- Alô. – A voz dele parecia mais grossa no telefone.  
- Alô Oliver sou eu, Jéssica.
- Como você está minha linda? – Sorri ao ouvir “minha linda”.
- Estou bem e você?
- Estou muito bem. Ontem à noite foi maravilhoso.
- É foi realmente maravilhoso.
- Você quebrou as regras. – Juntei as sobrancelhas sem entender.
- Como assim? Que regras? – Perguntei confusa.
- Quem deve ligar primeiro é o homem e não a mulher. – Sorri.
- Eu gosto de quebrar as regras de vez em quando. – O tom de minha voz era sarcástico.
- Desliga o telefone e vamos fazer do modo tradicional. – Antes que eu pudesse dizer alguma coisa Oliver desligou o telefone. Alguns segundos depois meu telefone tocou.
- Alô. – Falei.
- Alô Jéssica, como você está?
- Bem e você? – Respondi sarcástica.
- Bem também. O que acha de vim na minha casa agora?
- Seu bobo. – Ri baixo.
- Estou falando sério. Minha mãe e meu pai foram viajar. Estou sozinho aqui, queria sua companhia.
O sorriso da minha cara desapareceu. Será que Oliver só queria se aproveitar de mim? Eu estava com medo de me magoar, e se ele não gostasse de mim? E se ele não fosse quem eu pensava que era? Eu não sabia o que dizer.
- Jéssica você está ai? – Pulei de susto, eu me esqueci que Oliver esperava minha resposta no telefone.
- Estou, desculpa me distraí. Você está falando sério?
- Claro que estou. Detesto ficar sozinho em casa, queria muito sua companhia. Eu vou ai te buscar e falo com seu pai, se você quiser. – Pensei um pouco.
- Está bem. – Se ele só queria se aproveitar de mim era a chance de eu descobrir. Eu estava realmente gostando dele e se ele estivesse me enganando eu tinha que descobrir antes de me iludir.
- Estou indo. Até daqui a pouco. – Esperei ele desligar o telefone.
Como eu sabia que meu pai tinha gostado de Oliver, não ia me preocupar de Oliver ter que falar com ele. Escrevi um bilhete, avisando que eu ia passar à tarde com Oliver e deixei encima da mesa. Nem me preocupei em me arrumar. Fiquei esperando Oliver chegar, o que não demorou muito. Oliver bateu na porta e eu a abri. Ele estava todo lindo, com uma cara de sono e um sorriso que me hipnotizava. Ele se aproximou de mim e me deu um beijo.
- E então vamos? – Perguntou ele.
- Sim. – Respondi enquanto fechava a porta.
Quando chegamos em seu carro ele como sempre tão gentil e cavaleiro abriu a porta do carro para eu entrar. Seguimos para sua casa. Eu ficava tentando imaginar como era a casa dele. Não demorou muito até que chegássemos, a casa era totalmente diferente do que eu imaginei, em minha mente eu visualizava uma casa enorme e sofisticada, com janelas grandes de vidro, mas era uma casa simples, mas muito bem ajeitada, nas janelas cortinas com estampas de flores, a mobília parecia bem antiga, mas tudo em ótimo estado, as paredes tinham um tom de verde claro e muitos quadros pendurados.
- Está com fome? – Oliver perguntou.
- Um pouco. – Me lembrei de que acordei tarde e não tinha almoçado.
- Vou preparar alguma coisa para nós, você pode entrar naquela porta marrom ali, é meu quarto, fique à vontade. – Disse ele apontando para uma porta marrom no fim do corredor.
- Está bem. – Fui em direção à porta, abri e entrei. O quarto dele era arrumado, muito mais arrumado do que o meu, normalmente quartos de adolescentes são bagunçados, mas o dele era extremamente organizado. A parede estava cheia de fotos, de pessoas, animais e paisagens. Me distraí olhando as fotos, ele surgiu com refrigerante e sanduíches atrás de mim.
- Você que tirou estas fotos?- Perguntei, ainda olhando para as fotos na parede.
- Sim. Sou fotógrafo. Ainda não profissional, mas um dia serei.
- São muito boas. – Falei ainda admirando as fotos na parede.
Oliver agarrou minha cintura e me virou de frente para ele, colocando suas mãos em minha cintura novamente, eu coloquei meu braço que não estava engessado em volta de sua nuca e ficamos abraçados, ele mantinha cuidado com meu braço quebrado. Meu coração começou a bater mais forte, ficamos nos olhando em silêncio. O rosto dele era perfeito, seus olhos verdes brilhavam olhando para mim.
- Você é tão linda. – Sussurrou ele em meu ouvido. E logo em seguida me beijou. Suas mãos envolviam meu corpo, me apertando cada vez mais ao corpo dele. Os movimentos de nosso beijo parecendo ensaiado de repente foi acelerando o ritmo. Eu comecei a empurrá-lo para a cama, com o braço bom, ele não resistiu então foi fácil, enquanto deitávamos na cama nossos lábios não se desgrudavam. Minhas veias pareciam estar pegando fogo. Eu queria o corpo de Oliver, o desejo era maior do que meu autocontrole. Quando finalmente consegui abrir o primeiro botão da camiseta dele, ele segurou minha mão e parou de me beijar, me levantei de cima dele confusa. Ele ficou calado.
- O que aconteceu? Achei que você queria que eu viesse aqui para isso.  – Julguei sua atitude. 
- Não Jéssica. Eu queria que você viesse para ficar comigo, para me fazer companhia, eu gosto de você de verdade, queria poder ter você todos os dias ao meu lado.
- Mas... – Tentei protestar.   
 - Eu sei que você deve ter pensado que sou igual aos outros garotos que só querem usar as garotas, mas não, eu não sou assim. Eu quero ter um relacionamento sério com você. – Ele me interrompeu.  
- Mas se gosta de mim porque não quis continuar? – Perguntei confusa.
- Por que eu não quero que isso seja deste jeito. Tem que ser especial.
- Então você é virgem? – Perguntei, incrédula.
- Sim. – Ele respondeu timidamente.
- Que ótimo, pois eu também sou. – Segurei sua mão, ele olhou para mim e nós dois sorrimos.
- E então não estava com fome? Vamos comer os sanduíches e depois tenho uma surpresa para você.
- Que surpresa? – Perguntei.
- Vamos comer primeiro depois você verá qual é a surpresa. – Ele protestou.
- Estou com medo, detesto surpresas. – Murmurei.
- Porque detesta surpresas?
- Porque na maioria das vezes elas são ruins. – Reclamei.    
- Não se preocupe a surpresa que tenho para você é boa. – Disse ele pegando os sanduíches e os copos de refrigerante.  
Ficamos sentados na cama, comendo os sanduíches e tomando o refrigerante. Eu não conseguia parar de pensar na surpresa que Oliver tinha para mim. Ele gostava de mim tanto quanto eu gostava dele, agora eu tinha certeza disso porque ele me provou com sua atitude. Eu estava mais do que certa que estava apaixonada por ele, mas dizer eu te amo não combinava comigo, pra dizer a verdade eu nem sábia se algum dia conseguiria dizer está frase para alguém. Enquanto eu terminava de comer meu sanduíche, Oliver brincava com meu cabelo.
- Pronto terminei de comer, agora, por favor, me diz qual é a surpresa antes que você me mate de curiosidade. – Protestei.    
- Curiosa. Fique ai então que eu vou buscar a sua surpresa. – Ele sorriu para mim, se levantou da cama e foi buscar a minha surpresa. Fiquei olhando para as fotos na parede novamente, eram tantas e tão belas que era impossível não olhar. Oliver estava demorando, comecei a ficar impaciente, não conseguia imaginar o que seria a tal surpresa.
- Voltei. – Oliver surgiu, escondendo algo nas costas. Supostamente minha surpresa. Fiquei tentando olhar o que era, mas ele não deixava.
- Feche os olhos. – Ordenou ele.
- Está bem. – Obedeci. Fechei meus olhos e esperei a surpresa... Continua....  

quinta-feira, 14 de junho de 2012

3. Descobrindo um sentimento



Quando o despertador tocou, eu estava animada pela 1º vez para ir para a escola.
Me arrumei o mais rápido que pude, peguei uma maça na cozinha e fui para a parada do ônibus. Nem me importei com os olhares voltados para mim. Cheguei na escola e ele não estava lá, sentei em meu lugar, os alunos foram chegando, menos ele, me senti uma idiota por ficar tão impaciente, quando eu já estava perdendo as esperanças de que ele viria na aula, ele entrou na sala e foi direto em minha direção.
- Oi amiga. – A garota que sentava ao meu lado, ficou olhando, assustada quando ele parou ao meu lado e me deu oi.
- Oi amigo, como você tá? – Perguntei sorrindo para ele.
- Bem e você? – Ele também respondeu sorrindo.
- Também.
O professor de matemática chegou.
- Na hora do recreio se você quiser pode ficar comigo, com o Thomas, com a Ester e com o Lucas, são meus amigos, são meio doidos, mas acho que você vai gostar deles. – Ele falou apontando pra um grupo de três pessoas do outro lado da sala.
- Está bem.
- Oliver sente-se no seu lugar. – Ordenou o professor de matemática.
Oliver obedeceu imediatamente, aquele professor me dava medo, quando sentou em seu lugar olhou para mim sorrindo. Percebi que a garota ao meu lado ainda olhava para mim com curiosidade, tentando entender porque Oliver veio falar comigo. Como havia gritado com ela no primeiro dia de aula e não passei uma boa impressão resolvi me desculpar.
- Seu nome é Lua né? – Perguntei.
- Sim. – Ela respondeu tímida.
- Desculpa aquele dia eu ter gritado com você, eu não pretendia ser tão estúpida com você. – Ela ficou olhando para mim, parecia tentar decifrar alguma coisa.
- Tudo bem.
- Podemos ser amigas, o que acha?
- Claro podemos. – Ela sorriu. – Você morava aonde antes de vim pra cá?
- Em Marvin.
- Vocês duas ai, fiquem quietas. – Falou o professor de matemática apontando para nós.
- Ele é um chato né. – Falei sussurrando.    
- Sim he.he.he.he. – Ela riu baixo.
 Quando tocou o sinal para o recreio fiquei animada.
- Lua, você fica com quem na hora do recreio?
- Com ninguém, minha melhor amiga Joyce foi embora há algumas semanas.
- Então porque você não vem com a gente?
Ela olhou para trás de mim, Oliver estava vindo.
- Ola meninas.
- Ola. – Respondemos juntas.
- E então Lua vem com a gente? – Perguntei.
- Sim.  
- Então vamos logo porque o recreio é curto. – Falou Oliver empurrando nós duas. Nós rimos.   
Quando chegamos no refeitório olhei para a mesa onde estavam os amigos de Oliver, um ruivo gordinho devorava um bolo de chocolate e ao lado dele estavam uma garota loira, tão linda que parecia aquelas modelos de capa de revista, ao lado dela um garoto moreno a abraçava.
- Sentem meninas. – Falou Oliver que se sentou ao lado do ruivo comilão. Lua sentou-se ao lado de Oliver e eu ao lado dela.
- Oi aluna nova, prazer sou Ester. – Disse a loira para mim.
- Oi, sou Jéssica.
- Este daqui é meu namorado Lucas – Falou olhando para o moreno abraçado a ela.
- Ola Jéssica, o que está achando de Bela Rosa? – Perguntou Lucas.
- Estou gostando, todos aqui são bem simpáticos. – Respondi.
O gordinho ruivo que estava com um pedaço de bolo de chocolate acenou para mim.
- Ah aquele é o Thomas, acho que ele está com a boca cheia de mais para conseguir se apresentar. – Disse Oliver.
- Prazer Thomas. – Falei, ele ainda estava com a boca cheia de mais para conseguir me responder, então acenou com a mão que estava desocupada. Lua ficou quieta, parecia tímida de mais, diferente daquela garota tagarela que eu tive que mandar calar a boca no 1º dia de aula.
- Vocês já conhecem a Lua não é? – Perguntei para todos na mesa.
- Conhecemos ela da turma, mas ela nunca foi de muito papo. – Falou Ester. 
- É que sou tímida. – Disse Lua de cabeça baixa.
- Mas no primeiro dia de aula, você não me pareceu tímida, não parou de falar um minuto. – Ela deu de ombros e se encolheu.
- Você veio de Marvin então Jéssica? – Perguntou Ester.
- Sim.
- Como é lá?
- Não é uma cidade muito grande, é conhecida como a cidade das lanchonetes, você encontra lanchonetes em cada esquina, eu morava na frente de uma, acho que é por isso que meu pai é gordo. – Eu ri.
- Hum... Você falou em lanchonete e me deu uma fome. – Finalmente o gordinho ruivo falou. – Vou pegar mais um pedaço de bolo de chocolate.
- Você só pensa em comer seu gorducho – Disse Lucas.  
O gordinho mostrou a língua para ele e ele levantou e beliscou as bochechas dele.
- Seus crianções. – Disse Oliver.
Eu, Ester, Lua e Oliver começamos a rir quando Lucas começou a correr atrás de Thomas para pegar seu bolo de chocolate, o que não foi difícil, Thomas não conseguia correr muito, quando Lucas pegou o bolo da mão de Thomas, ele parecia que ia chorar.
- Devolve! – Reclamou Thomas.
- Você quer o meu pedaço de bolo? Eu não to com fome – Falei para ele, que sorriu.
- Quero, quero. – Ele parecia uma criança.
Peguei meu prato com um pedaço de bolo de chocolate e entreguei para ele.
- Obrigado. – Ele falou com a boca cheia.
- De nada. – Falei sorrindo para ele, que estava vidrado no bolo.
- Não falei que ele só pensa em comer, seu gorducho. – Falou Lucas.
- Eu também não estou com fome, pode pegar meu pedaço de bolo também. –Disse Lua.
Thomas se levantou e pegou o pedaço de bolo de Lua.
- Nossa Oliver, suas amigas são de mais. – Disse Thomas com a boca cheia de novo.
Oliver olhou para mim e sorriu.
Eu fiquei observando Lua, ela não parava de olhar para Thomas, que estava devorando seu pedaço de bolo, o olhar dela era de uma garotinha apaixonada, fiquei pensando se ela estava apaixonada por ele, por isso estava tão tímida, mas olhando aquele garoto ruivo e gorducho devorando aquele pedaço de bolo era meio difícil de imaginar que aquela garota meiga, que usava vestidos com laços estivesse apaixonada por ele.
Eu estava me divertindo com as palhaçadas de Lucas, quando tocou o sinal de que o recreio acabará. Todos nós ficamos infelizes.
- Mais uma aula de matemática com aquele professor chato, quando eu for diretor desta escola vou expulsar este professor daqui. – Zombou Lucas.
- Seu bobo. – Disse Ester e logo depois deu um beijo nele. 
- Vamos ir pra sala, vocês sabem como o professor Wilson gosta de castigar quem chega atrasado nas aulas dele. – Disse Oliver.
Nós nos levantamos e fomos para a sala de aula, os outros alunos ficaram olhando para nós, eu me senti estranha caminhando ao lado daquele grupo, eu me esquecerá de como era bom ter amigos.
As horas passaram rápido, eu e Lua fizemos um trabalho de matemática juntas, nós duas tínhamos dificuldades para resolver os cálculos. O último período passou rápido, como aquela manhã. Quando tocou o sinal de que a aula acabou, não senti necessidade de ir para o lago e ficar sozinha mais uma vez, eu queria ir para casa contar para Cristal sobre este dia na escola e das pessoas que conheci.
- Tchau Jéssica. – Disse Lua, entrando em uma caminhonete azul.
- Tchau Lua.
Thomas passou por mim apressado com Oliver ao seu lado. 
- Tchau Jéssica. – Disse Thomas.
- Tchau.
- Eu e o Thomas vamos ir numa pizzaria, você não quer ir com nós? – Disse Oliver, entendi o porquê Thomas estava tão apresado.
- Deixa pra outro dia.
- Que tal sábado? – Sugeriu ele.
- Hum... Combinado. – Concordei.
- Vamos Oliver to com fome. – Disse Thomas puxando Oliver pelo braço.
- Tchau Jéssica.
- Tchau Oliver. – Acenei.


Passaram-se três semanas. E todos os dias na escola eu ficava com Oliver, Lua, Thomas, Lucas e Ester na hora do recreio. Todos me divertiam muito. As brigas entre eu e meu pai diminuíram nestas três semanas.  As coisas estavam calmas de mais em casa, era de se estranhar. .
Um dia depois da escola cheguei em casa e meu pai não havia chegado do serviço ainda, peguei Cristal que estava dormindo no canto da escada e comecei a brincar com ela quando meu pai chegou.
- Oi pai. - Murmurei
- Jéssica, a dona de uma lanchonete ligou, ela falou que você pode começar a trabalhar amanhã.
Eu quase esqueci de que tinha deixado um currículo lá.
- Que ótimo pai. – Suspirei feliz.
- Calma ai mocinha, eu falei pra ela arranjar outra pessoa para trabalhar lá. – Falou ele autoritário.  
- Mas por quê? – Perguntei sem entender.
- Por que você não vai trabalhar lá e nem em lugar nenhum! Não vou deixar você trabalhar para estragar sua vida bebendo, se você precisar de alguma coisa eu compro! – Ele falou tão alto que qualquer um que passasse pela rua poderia escutar.
- Você não pode me obrigar a não trabalhar! –  Protestei.
- Posso sim sou seu pai! -
- Eu quero trabalhar. Você não vai me obrigar a não ir!
- Vou sim!
Subi as escadas correndo e bati a porta de meu quarto.
- Jéssica! – Meu pai gritou.
O ignorei, deitei em minha cama e comecei a chorar. Era incrível como as palavras de meu pai conseguiam me magoar tanto, naquele momento o que eu mais queria era ter minha mãe ao meu lado, contar para ela como fora meu dia na escola, falar como eram meus novos amigos e como eu ficava feliz quando estava ao lado de Oliver.
No silêncio do meu quarto, olhei para uma pequena mesa próxima a janela e me lembrei de que eu tinha um note book novinho, que ganhei de presente de aniversário de 15 anos do meu pai, eu o usei poucas vezes, não tinha muita paciência para redes sócias. Peguei o note book e comecei a ver fotos de minha mãe e eu. Era uma tortura ver aquelas fotos e me lembrar de como a vida parecia perfeita quando minha mãe estava viva, as lágrimas foram inevitáveis junto com as lembranças.
Eu estava certa de que precisava de uma única coisa para que meus pensamentos que me atormentavam cessassem. Comecei a revirar meu guarda-roupa na esperança de encontrar uma garrafa de vinho vazia ou um restinho de uísque. Encontrei uma garrafa de vinho enrolada em um roupão velho de banho, liguei o rádio, queria colocar o volume no máximo, mas sabia que isso atrairia meu pai, então deixei o volume num tom que só quem estivesse dentro do quarto pudesse ouvir. Comecei a beber o vinho, doce gosto familiar. Quando a garrafa de vinho acabou senti necessidade de beber mais, eu precisava de mais. Peguei minha carteira e encontrei apenas uma moeda de 50 centavos. Eu precisava tanto de mais uma garrafa de vinho que fui até o quarto de meu pai à procura de dinheiro, mas antes fui até a garagem verificar se o táxi estava lá, como imaginava ele já havia saído para trabalhar, revirei as gavetas de seu guarda-roupa e encontrei 50 reais e algumas notas de 10, peguei apenas os 50 reais fui até meu quarto, coloquei meu casaco preto, peguei minha mochila e saí.
Eu sabia muito bem onde eu queria ir, fui até o bar e comprei duas garrafas de vinho e uma carteira de cigarros depois fui até o lago. Comecei a beber o vinho e fumar os cigarros, eu estava com fome, mas naquele momento o vinho serviria como alimento para mim. Acabei pegando no sono, como na noite em que conheci Oliver, me acordei quando já era noite, coloquei a mão no bolso tentando encontrar meu celular, mas não encontrei, tentei me lembrar se tinha deixado em casa, mas não conseguia. Comecei a me sentir mal e enjoada, vomitei. Um vômito roxo. Comecei a caminhar, com falta de equilíbrio, eu ainda estava enjoada e não conseguia me equilibrar muito bem, a escuridão da noite não ajudava nada para eu enxergar meu caminho, meus passos eram desajeitados, quando fui atravessar a rua, só consegui enxergar um feche de luz muito próximo, logo depois um apagão. 

Quando abri os olhos, estava numa cama de hospital. Meu pai estava dormindo em um sofá ao meu lado e em duas cadeiras mais distantes visualizei Oliver e Thomas sentados, Oliver lia um livro enquanto Thomas devorava um pacote de Doritos.
Tentei me levantar, mas minhas pernas doíam e meu braço esquerdo estava enfaixado.
- O que aconteceu? – Perguntei com a voz fraca.
Oliver levantou da cadeira e chegou perto de mim.
- Você foi atropelada ontem à noite. – Disse-me  ele.
Fiquei tentando me lembrar do que tinha acontecido, mas minha memória era fraca de mais.
- Há quanto tempo vocês estão aqui?
- Eu e Thomas viemos para cá logo depois da aula.
- E como você soube que eu estava aqui?
- Você foi atropelada bem em frente a minha casa. Fui eu quem foi até sua casa avisar seu pai.
- Ah quanto tempo ele está dormindo? – Perguntei olhando para meu pai, dormindo desajeitado no sofá.
- Ele pegou no sono faz pouco tempo. Quer me contar o que aconteceu? 
- Agora não. – Sussurrei. 
- Quer que eu acorde seu pai?
- Não, ele deve estar bem cansado e também não estou ansiosa para ouvir os sermões dele. O que eu quero mesmo é sair desta cama. – Falei tentando me levantar da cama de novo.
- Mocinha fique quieta ai, você foi atropelada.
- Está bem Doutor Oliver. – Tentei ser irônica. 
- Jéssica minha filha, você está bem? – Meu pai acordou assustado.
- Estou pai, sobrevivi. – Falei, esperando uma bronca.
- Jéssica ainda bem que você está bem, fiquei tão preocupado. – Ele disse me abraçando com cuidado. Nunca virá ele tão afetuoso comigo.
- Está bem pai, pode me soltar estou bem. – Murmurei. 
- Desculpe Jéssica.
- Pelo que?
- Por ser um pai tão irresponsável.
Engoli em seco, eu sabia que meu pai não era irresponsável, ele era só pai e eu acho que de certa forma eu o culpava pela morte de minha mãe.
- Você não é um pai irresponsável pai, você é só pai e está fazendo seu trabalho.
Ele me abraçou de novo, por um longo tempo ficamos abraçados, o abraço dele fazia meus ferimentos doerem, mas agüentei a dor para não magoá-lo. Quando ele decidiu me soltar, olhei em volta do quarto e Oliver e Thomas não estavam mais lá.
- Eu preciso trabalhar você vai ficar bem aqui sozinha?
- Sim pai pode ir.
Neste momento Oliver e Thomas entraram no quarto, Thomas ainda devorava um pacote de Doritos.
- Ah acho que estes dois podem ficar aqui com você. – Meu pai falou olhando para Oliver e Thomas.
- Não precisa, eu vou ficar bem sozinha, aliás, estou em um hospital, qualquer coisa chamo alguém.
- Imagina Jéssica eu e Thomas podemos ficar aqui com você.
- Eu preciso ir pra casa, minha mãe vai fazer pudim hoje. – Reclamou o gorducho do Thomas, chupando os dedos sujos de Doritos.
- Eu fico aqui com você. – Insistiu Oliver.
- Tchau Jéssica, qualquer coisa liga pra mim. – Meu pai falou saindo do quarto.
- Vou nessa. – Thomas saiu logo atrás de meu pai.
- Tem certeza de que quer ficar? Eu costumo ser chata quando estou numa cama de hospital.
- Eu agüento. Mas então quer me contar o que aconteceu, estou realmente querendo saber.
- Eu briguei com meu pai, bebi muito vinho e acabei dormindo mais uma vez à beira do lago, só que desta vez você não apareceu pra me levar pra casa, então tentei ir, mas mal conseguia manter o equilíbrio só lembro de estar atravessando a rua e ver uma luz forte em minha direção e depois acordei aqui.
- Você podia ter morrido Jéssica. – As palavras dele me fizeram estremecer.
- Talvez fosse melhor se eu tivesse morrido. -
- Porque está dizendo isso?
- Eu perdi a vontade de viver quando minha mãe morreu.
- Eu sei que deve ter sido horrível perder sua mãe, mas eu aposto que onde ela estiver agora ela vai te proteger.
- Ela morreu como vai me proteger? – Minha pergunta era retórica, mas mesmo assim ele respondeu.
- O espírito dela vai. – Afirmou ele.
- Ah, por favor, não venha me falar sobre espírito, Deus, céu e inferno, isso não existe! – Protestei num tom de voz alto, mas logo depois me arrependi, Oliver não merecia que eu falasse daquele jeito com ele.
- Me desculpa, só tava querendo fazer você se sentir melhor. – Falou arrependido.
- Eu que peço desculpas, não deveria falar assim com você. – Sussurrei.   
- Tudo bem. Mas me diz por que você não acredita em Deus? – Perguntou ele.
- Porque eu tenho meus motivos. – Respondi.
- Eu entendo você. Se quiser que eu vá embora eu vou. – murmurou.
Fiquei em silêncio, eu não queria que ele fosse embora, a companhia dele era ótima e eu gostava de estar com ele.
- Não. Eu quero que você fique gosto da sua companhia.
- Que bom ouvir isso.
O cheiro do hospital e a comida que me deram para comer, me enjoava, mas a companhia de Oliver me fazia querer ficar mais tempo ali, só para pode ficar ao seu lado. O dia passou rápido, eu e Oliver jogamos cartas, contamos piadas e histórias, apesar de eu estar deitada naquela cama de hospital, com o braço quebrado e o corpo cheio de aranhões aquele estava sendo um dos melhores dias da minha vida.
- Já são 8 horas, daqui a pouco seu pai deve estar chegando. Eu tenho que ir pra casa se não minha mãe vai ficar preocupada comigo. Boa noite. – Falou ele me dando um beijo na testa.
- Boa noite, tome cuidado ao ir para casa. – Fiquei olhando ele se afastar e ir embora.
Não demorou muito tempo para meu pai chegar, insisti para que ele fosse dormir em casa, mas ele era teimoso igual a mim e dormiu mais uma vez no sofá ao meu lado. Eu não conseguia dormir, fiquei pensando em Oliver, em como eu me sentia feliz ao seu lado, senti muita vontade de estar com ele de novo. Eu sabia que eu estava sentindo algo extremamente forte por Oliver e que eu não queria sentir aquilo. Minha filosofia de vida “Se você ama você sofre.” E eu não queria sofrer mais uma vez.

Eu e Oliver caminhávamos à beira do lago de mãos dadas. Minha mãe nos esperava encostada em uma árvore, ela estava com um vestido de noiva, todo sujo. Quando mais perto de minha mãe eu e Oliver tentávamos chegar mais longe ela parecia estar. De repente aquele cenário mudou, minha mãe e Oliver sumiram como se fossem fumaça, eu estava sozinha à beira do lago, minhas mãos estavam cobertas de sangue, fui lavá-las no lago e minha mãe e Oliver estavam lá dentro, se afogando, eu tentava salvá-los, mas era como se a água do lago estivesse congelada. Acordei assustada. – minhas pálpebras se arregalando, meu braço doía, devo ter batido durante a noite.
Foi só um sonho, disse a mim mesma. Olhei para o lado meu pai cochilava no sofá. Fiquei olhando para o teto branco do hospital, me senti angustiada de estar ali. Até meu quarto todo bagunçado era melhor do que aquele quarto de hospital. Uma enfermeira entrou no quarto.
- Precisa de alguma coisa? – Perguntou ela.
- Preciso ir embora. – Murmurei.
- Eu acho que você já pode ir embora hoje, vou chamar o doutor David. -
Suspirei aliviada.
- Dormiu bem Jéssica? – Meu pai acordou.
- Sim pai. – Menti.
- Está com fome? – Perguntou.
- Sim – Assenti.
- Vou ir buscar algo para nós comer. Já volto. – Assenti mais uma vez.
Alguns minutos depois que meu pai saiu o doutor David chegou.
- Como está se sentindo Jéssica? – Perguntou examinando meu braço enfaixado.
- Bem. – Não queria falar que meu braço estava doendo, quanto mais rápido eu saísse daquele hospital, melhor.
- Você já pode ir para casa hoje. Só vai ter que tomar muito cuidado com este braço. Onde está seu pai?
- Foi comprar alguma coisa para comer. – Meu pai apareceu na porta.
- Estávamos falando do senhor. A Jéssica pode ir para casa hoje. O senhor pode me acompanhar por gentileza.
- Claro. – Meu pai respondeu me entregando um copo de café e um pastel.
Os dois saíram do quarto. Levantei da cama com dificuldade, meus ferimentos incomodavam. Tentei me vestir apenas com uma mão. Mas não consegui, o braço quebrado doía muito quando tentava meche-lo. Por sorte a enfermeira chegou bem a tempo de me ajudar. Fiquei constrangida de alguém estar ajudando a me vestir. Sentei na cama e comi o pastel e tomei o café.
Fui para casa no táxi do meu pai.  Eu queria ir à escola, ver Oliver e meus novos amigos, mas eu sabia que meu pai não deixaria e também meu braço direito estava quebrado, justo o braço que eu usava para escrever, minha letra já não era muito bonita, escrevendo com a mão esquerda minha letra ficaria ilegível. Antes de irmos para casa meu pai parou numa farmácia e comprou alguns comprimidos para mim.
Senti um alivio instantâneo ao chegar em casa. Eu odiava o cheiro de hospital.
Subi para meu quarto me apoiando com a mão que estava boa no corrimão da escada. Deitei em minha cama. Familiar cheiro de bagunça. Engoli um analgésico e adormeci. Quando me acordei já estava escuro. Levantei da cama meio sonolenta e desci as escadas me apoiando novamente no corrimão com a mão boa. Quando entrei na sala tive uma enorme surpresa, Oliver estava sentado no sofá, ao lado de meu pai.
- Até que enfim acordou dorminhoca. – Oliver disse sarcástico.
- Dormir numa cama de hospital não é muito agradável. O que você está fazendo aqui? – Perguntei.
Meu pai olhou para mim e logo em seguida para Oliver, entendi aquele olhar como um aviso, logo em seguida levantou e foi para a cozinha.
- Vim ver como você está. – Oliver respondeu.
- Estou bem, só o braço quebrado está me incomodando um pouco.
- Na verdade vim ver como você está e vim cobrar uma ida a pizzaria.
- Caramba, esqueci totalmente que a gente tinha combinado de ir à pizzaria.
- Posso vim te pegar amanhã de noite?     
- Pode. –  Concordei olhando em direção a cozinha para me certificar que meu pai não iria interferir na minha resposta.
- Então está combinado, às 19h30min esteja pronta.
- Vou estar pronta e com o braço enfaixado. – Sorri.
Oliver sorriu e levantou do sofá logo em seguida.
 - Até amanhã. – Falou ele indo em direção à porta.
- Espera, eu te levo até a porta. – murmurei.
Enquanto caminhávamos até a porta meu pai surgiu da porta da cozinha e ficou nos observando.
- Boa noite Oliver.
- Boa noite Jéssica.
Eu parecia uma boba, apaixonada olhando Oliver se afastar e entrar em seu carro. Fiquei tão distraída imóvel na porta que tomei um susto quando meu pai surgiu atrás de mim.
- Então Jéssica vocês estão namorando?
Engoli em seco.
- Não... é claro que não pai, somos só amigos. – Gaguejei.
- Ele parece gostar de você. Se preocupa muito em saber se você está bem. – grunhiu ele.
- Para de falar bobagem pai. Vou ir para meu quarto. – Suspirei.
- Ele parece ser um ótimo garoto Jéssica. –Eu sabia que meu pai não desistiria.
- Somos só amigos pai. – Protestei.
- Conversei com ele antes e parece que ele não quer só sua amizade.
- Vou ir para meu quarto. Ah pai Oliver vai vim me buscar amanhã para irmos numa pizzaria. – Eu nem precisaria pedir permissão de meu pai para sair com Oliver, pelo jeito ele gostou mais dele do que eu.
- Está bem. Olha Jéssica ele parece ser um menino muito bom, mas se ele tentar alguma coisa leve seu spray de pimenta...    
- Já entendi pai. – O interronpi. Subi para meu quarto. Eu não estava nem um pouco com sono. Fiquei pensando na pergunta que meu pai me fez “...Vocês estão namorando?”, eu sabia que meu sentimento por Oliver estava indo além da amizade. Ele se preocupava comigo, sempre queria saber se eu estava bem, com ele eu conseguia conversar abertamente, me sentia segura, eu confiava nele. Oliver era o único que me fazia sentir feliz, como minha mãe fazia. Eu estava ansiosa para que o amanhã chegasse.



Eu não tinha nada para vestir. Só os mesmos moletons e as mesmas calças jeans velhas. Era só uma ida a pizzaria, mas eu queria me vestir bem. Oliver sempre estava bem vestido e cheiroso, era até constrangedor eu ao lado dele, com minhas roupas velhas e meu cabelo bagunçado e agora com um braço enfaixado. Entrei em desespero revirando meu guarda-roupa com a mão boa, procurando algo para vestir. Acabei colocando uma calça jeans qualquer, uma camiseta do Nirvana e meu all star sujo, penteei meu cabelo e fiquei esperando impaciente Oliver, não eram nem 19h e 15 min quando ouvi alguém bater na porta. Olhei para Oliver, seu cabelo comprido até a nuca, bem penteado, seus olhos verdes brilhavam, eu queria ver qual roupa ele vestia, mas não conseguia desviar o olhar de seus olhos.
- Está pronta? Cheguei um pouco mais cedo.
- Estou. Eu estava prevendo que você viria mais cedo e também me arrumei mais cedo. – Ele olhou para minha roupa.
- Gostei da camiseta. – Nós rimos.
Oliver era mesmo muito gentil, um legitimo cavalheiro, abriu a porta do carro para mim. No caminho para a pizzaria Oliver começou a me contar coisas sobre ele, já que toda vez que nos encontrávamos só quem falava sobre sua vida era eu. Contou que seu pai era um policial aposentado e que sua mãe era a melhor costureira da cidade. Ficamos conversando durante todo o percurso. Quando eu estava com Oliver o tempo parecia passar mais rápido. Quando chegamos à pizzaria Oliver manteve o cavalheirismo e abriu a porta do carro para eu sair. A pizzaria estava cheia. Sentamos num canto perto da janela.
- Vamos pedir pizza do que? – Perguntou Oliver olhando o cardápio.
- Meia 4 queijos e meia calabresa pode ser?
- Claro, são meus sabores de pizza preferidos.
- Os meus também. – Rimos juntos.
Oliver chamou o garçom e fez o pedido. Não demorou muito até para a pizza chegar.    
- A pizza daqui é muito boa. – Falei com a boca cheia, o que me fez lembrar de Thomas.
- É mesmo. – concordou ele – Jéssica eu quero te falar uma coisa.
Olhei para ele assustada. – Pode falar. –
- Bom, nem sei direito como dizer isso... Desde o dia em que conheci você, à beira daquele lago, dormindo no chão eu sabia que queria ser seu amigo, você é diferente de todas as garotas que já conheci. Você não se ilude com as coisas, é sincera e ao mesmo tempo em que você é uma garota impaciente, que não quer amigos, você é uma garota meiga que senti falta de sua mãe... – Eu não sabia aonde ele queria chegar. – Cada vez mais que eu ia te conhecendo eu ia me sentindo extremamente ligado a você. Sabe aquela coisa de destino? Então é... acho que isso se encaixa na nossa história. Jéssica eu to apaixonado por você. – Fiquei em estado de choque, não conseguia achar palavras, as palavras certas.
- Eu... Não sei o que dizer. - Gaguejei. 
- Olha vamos comer primeiro e depois procuramos um lugar mais calmo para conversar. –Eu assenti .
Enquanto eu comia, não conseguia parar de pensar nas palavras de Oliver, ele estava apaixonado por mim? Era difícil de acreditar que alguém pudesse se apaixonar por mim. Eu também estava loucamente apaixonada por ele. Mas não sabia até onde eu poderia ir. Fiquei tão distraída em meus pensamentos que esqueci da pizza.
- Você vai comer mais? – Oliver perguntou para mim olhando para meu prato, com um pedaço de pizza intacto.
- Não. – Respondi.
- Então vamos?
Me levantei e seguimos para o carro.
- Aonde você quer ir? - Perguntei enquanto ele segurava a porta do carro para eu entrar.
- Naquele lago. – Seguimos para o lago em silêncio.
Sentamos a beira do lago. Meu coração e minha respiração estavam acelerados, eu podia ouvir meus batimentos. Fiquei ali sentada ao lado dele esperando que ele começasse a falar. Por um longo tempo ficamos em silêncio, observando o lago que reluzia a luz da lua. Acho que Oliver procurava as palavras em sua mente para me dizer. 
- Então, como eu disse antes estou apaixonado por você Jéssica. Eu sinto que não posso mais ficar longe de você.
O silêncio voltou a invadir o ambiente. Ele esperava que eu falasse alguma coisa, mas eu não sabia o que falar.
- Eu devo estar assustando você... Me desculpe, eu só achava que deveria dizer o que estou sentindo. – Falou sussurrando.
Finalmente consegui falar.
- Eu... Acho que também to... apaixo... nada por você. – Gaguejei, não sabia o jeito certo de dizer aquilo.  
Ele pegou meu rosto com as mãos, olhou em meus olhos e foi se aproximando. Quando me dei conta nossos lábios estavam se tocando, os movimentos de nossos lábios encostados um no outro pareciam ter sido ensaiados, os braços dele envolvidos em minha cintura, nossos corpos colados, meu coração parecia que ia explodir a qualquer momento. Demorei a lembrar de que eu precisava respirar. Precisei soltar meus lábios dos dele, estava sem fôlego. Depois de uma pequena pausa nossos lábios voltaram a se tocar. Eu estava tão feliz nos braços dele que não queria que aquele momento nunca acabasse. O céu estava lindamente estrelado, no lago o reflexo da lua cheia. Caminhamos de mãos dadas em volta do lago – Como no meu sonho - era só eu, ele, o lago e a lua, eu podia estar sonhando, tudo àquilo era tão perfeito, como em contos de fadas e não era um sonho, pelos menos eu estava torcendo para que não fosse. Eu queria ficar ali do lado dele para sempre, ou sendo menos dramática, durante o resto da noite.
Às horas passaram tão rápido, já era passada da meia noite, estranho meu pai não ter me ligado preocupado, ainda mais depois do acidente. Oliver me levou para casa no seu carro. Quando chegamos à frente de minha casa, ele me acompanhou até porta e demos um beijo de despedida, como numa cena de filme romântico. Entrei em casa e fiquei olhando ele ir embora. Meu pai já estava dormindo. Subi para meu quarto, estava tão distraída que tropecei no tapete e caí, caí em cima do meu braço quebrado.
- Aiii! – A dor foi tanta que não consegui segurar o grito.
- O que aconteceu Jéssica? – Meu pai apareceu na porta do quarto, meu grito o acordará.
- Eu tropecei e caí encima do braço quebrado. – Gemi caída no chão.
Meu pai ajudou a me levantar. Fiquei constrangida com aquela situação.
- Está doendo muito? – Perguntou meu pai.
- Um pouco. – Menti, a dor estava evidente em minha voz.
- Vou pegar seu remédio na cozinha.
- Está bem.
Ele desceu as escadas até a cozinha. Fiquei sentada em minha cama. Eu sentia a pulsação de meu braço que doía.
    

sexta-feira, 8 de junho de 2012

2. Encontro



            Acordei assustada, tive um pesadelo, minha mãe estava correndo atrás de mim em chamas, este tipo de pesadelo estava se tornando constante. Levantei da cama e coloquei meu casaco preto desbotado preferido que estava jogado em cima de algumas caixas da mudança, peguei meu Mp4 e desci as escadas, meu pai já havia saído, supostamente foi me matricular em alguma escola pois o táxi estava na garagem, então não foi trabalhar. Quando fui até a cozinha vi um bilhete encima da mesa:

Jéssica

Deixei alguns sanduíches prontos pra você na geladeira e dentro da garrafa térmica tem café quente, fui procurar uma escola para te matricular.
Boa sorte. Espero que consiga um emprego, já que é assim
que você quer, se cuide.
      
                                                                                                                                Seu pai

Meu pai ser tão carinhoso comigo não era um costume. Acho que finalmente ele estava compreendendo como as coisas estavam sendo difíceis para mim.
Tomei o café, comi um sanduíche, peguei minha mochila e alguns currículos e saí. A cidade me pareceu bem tranqüila, meu maior medo era de me perder e ter que ligar para meu pai ir me buscar, seria muito constrangedor.    
Deixei meu currículo numa lanchonete, numa loja de acessórios e num mercado.
Consegui deixar meu currículo somente nestes três lugares, porém levei a manhã toda. Tive muita sorte de não me perder, cheguei em casa e meu pai ainda não tinha chegado. Então me arrisquei a fazer o almoço, meu pai era um ótimo cozinheiro, mas eu mal sabia fritar um ovo.
      Olhei dentro da geladeira que estava quase vazia, peguei dois bifes fritei algumas batatinhas, quando estava arrumando a mesa meu pai chegou.
- Hum. Que cheirinho bom. – Falou ele olhando para o bife e as batatinhas fritas em cima da mesa.
- Eu fiz o máximo que eu pude, se tiver ruim de mais não precisa comer. – Dei um sorriso amarelo.
Meu pai se sentou à mesa, pegou um prato com um bife e serviu as batatinhas fritas, fiz o mesmo logo em seguida.
- Está muito bom Jéssica. – Ele realmente parecia ter gostado. Tenho que admitir estava bom mesmo.
- Obrigado pai.
- Jéssica te matriculei numa escola um pouco longe daqui, mas é a mais próxima que consegui encontrar, mas você pode ir de ônibus, a escola entregou este passe livre que você poderá usar. – Ele falou me entregando o passe livre.
Peguei o passe livre e guardei no bolso.
- Está bem. Quando começo a estudar? – Perguntei, mas já sabia a resposta, ele com certeza iria querer que eu começasse amanhã mesmo.
- Amanhã. 


6 Horas da manhã:
-Triiimmm – Tocou o despertador.
- Droga de despertador! – Eu disse ao acordar com o som irritante do despertador tocando.
Coloquei meu casaco preto desbotado preferido para ir para a escola, eu não tinha muitas opções de roupas para vestir, prendi meu cabelo, coloquei meu all star velho e sujo, peguei minha mochila e desci as escadas. Meu pai já havia saído para trabalhar, mais uma vez deixou sanduíche e café para mim. Comi o mais devagar que pude, eu realmente não estava ansiosa para o 1º dia na escola nova.
Peguei o ônibus na esquina de casa, ao entrar no ônibus percebi vários olhares curiosos para minha direção, evitei olhar para os donos daqueles olhares curiosos, segui para o fundo do ônibus, não demorou muito até chegar na escola. Era uma escola aparentemente pequena, era como qualquer escola, patricinhas mostrando suas roupas novas fazendo com que as garotas mal vestidas morressem de inveja, os “gostosões” malhados colocando medo nos magricelos, os intelectuais lendo seus livros e assim por diante. Depois de uma longa caminhada pela escola, finalmente encontrei onde era a sala do diretor. Bati na porta, eu estava nervosa.
-Entre. – Uma voz falou possivelmente a voz do diretor.
Entrei.
- Ah, você deve ser Jéssica, seu pai te matriculou ontem não é?
Antes que eu pudesse responder ele estendeu a mão para me cumprimentar.
- Prazer, sou o diretor Willian Saimon.
- Prazer, Jéssica Wanter – Tentei dar um sorriso simpático, mas acho que minha tentativa não deu certo.
- Seu pai me disse que moravam em Marvin, já tive uma vez lá é muito bonita a cidade, mas você vai gostar de Bela Rosa, é uma cidade bem calma, quase não ocorrem assaltos por aqui e as pessoas são bem hospitaleiras e simpáticas.
Concordei balançando a cabeça.
- Bom é só entregar este papel para seus professores – Falou ele me entregando um papel.
- Tenha uma boa aula e seja bem vinda à escola São Diego.
- Obrigada. – Sorri.
Sai da sala do diretor e fui procurar minha turma, o corredor que antes estava cheio de alunos, agora estava vazio.
Respirei fundo antes de bater na porta da sala de aula, quando tomei coragem bati na porta, uma professora gordinha de cabelos curtos e enrolados abriu.
- Ola. Aluna nova? – Perguntou ela com uma voz suave, tão suave que parecia estar ligada no volume mínimo.
- Sim sou Jéssica. – Respondi.
- Entre Jéssica, você pode se sentar ao lado de Lua. – Ela falou apontando para um garota baixinha de cabelos lisos e curtos e com uma roupa que parecia de boneca, cheia de laços, ela sorriu quando olhei pra ela. Caminhei com passos lentos até a cadeira vazia ao lado dela, quando sentei olhei a minha volta, todos os outros alunos olhavam pra mim, mas desviaram o olhar quando olhei para eles, me encolhi sem graça.
- Oi sou Lua, muito prazer. – Disse a garota baixinha sorridente ao meu lado.
- Oi, sou Jéssica. – Falei sem nem olhar para ela.
As horas passavam devagar, mal prestei atenção na aula, muito menos naquela garota baixinha ao meu lado tentando puxar assunto.
Na hora do recreio fiquei a maior parte do tempo sentada em um canto, onde não passava quase ninguém, eu não queria conhecer os alunos hospitaleiros  e simpáticos daquela escola, não mesmo.
Quando tocou o sinal esperei os corredores esvaziarem para voltar para a sala. A garota baixinha continuava insistindo em tentar fazer com que eu falasse com ela, quando ela começou a contar sobre um dia em que ela se afogou, eu perdi a paciência.
- Será que dá pra você calar sua boca! Eu não quero saber sobre sua vida! – Falei tão alto que todos olharam para mim, inclusive a professora que ignorou minha atitude.
Por um minuto pensei que a garota tagarela ia chorar, pensei em pedir desculpas, mas não era o tipo de atitude que eu queria demonstrar, então fiquei quieta no meu canto e a garota fez o mesmo.
Quando acabou a aula, não peguei o ônibus para ir pra casa, resolvi ir até um bar comprar algo para beber. Depois de algumas voltas na cidade encontrei um bar.
- Quanto custa àquela garrafa de uísque? – Falei apontando para uma garrafa de uísque para o homem que estava no balcão.
- 25 Reais.
- Vou levar – Peguei meus únicos 25 reais e entreguei para ele. Fiquei com medo de que ele não me vendesse, mas ele pegou o dinheiro e me entregou a garrafa de uísque.
Liguei para meu pai e avisei que iria sair por ai conhecer a cidade, não queria correr o risco de ele colocar a policia atrás de mim. Depois de um tempo caminhando pela cidade encontrei um lago, suficientemente escondido para que ninguém me incomodasse. Coloquei meus fones de ouvido e comecei a beber o uísque. Aquele lago me fez lembrar de quando eu e minha mãe acampávamos nas férias de verão, á noite ficávamos horas sentadas à beira de um lago, ela contava histórias de fadas, está lembrança me fez chorar. Fiquei sentada à beira do lago aos prantos, lembrando de como era boa àquela época com minha mãe, quando me dei conta já estava escurecendo e minha garrafa de uísque acabando. Deitei-me na grama e fiquei observando as estrelas, como eu e minha mãe fazíamos, as lágrimas voltaram a aparecer, eu sentia muita falta dela. Meus pensamentos foram tão longe no passado que adormeci ali mesmo, deitada sobre a grama.         
      

- Hei, acorda! Você está bem? – Alguém falou, me levantando, demorei um pouco para conseguir ver quem era, levei um susto ao ver quem me segurava em seu colo, era um garoto que vi na escola, estudava na mesma turma que eu, era um dos mais inteligentes respondia a todas as perguntas dos professores, era magro e com cabelos compridos, estava com uma expressão de preocupação no rosto.
- Estou... bem. – Gaguejei.
- Tem certeza? Eu estava passando por aqui e vi você deitada no chão. Você é aluna nova não é? Tem sorte por Bela Rosa ser uma cidade calma, sem violência, poderia ser muito perigoso. – Enquanto ele falava, percebi que eu ainda estava com minha cabeça apoiada em suas pernas. Tentei me levantar, mas não encontrei equilíbrio e caí.
- Droga! – Falei furiosa caída no chão.
- Deixa que eu te ajudo – Falou ele estendendo a mão para mim.
- Não quero ajuda eu sei me levantar sozinha!
- Você bebeu de mais, deixe eu te ajudar. – Ele falou apontando para a garrafa de uísque vazia ao meu lado.
- Eu não quero sua ajuda!
Consegui me levantar me apoiando em uma árvore, peguei minha mochila, comecei a caminhar, mas realmente eu tinha bebido de mais, tropecei nos meus próprios pés e quando estava caindo senti duas mãos me segurando.
- Você é surdo? Eu disse que não quero sua ajuda! – Falei irritada por não conseguir me equilibrar, eu sabia que não iria conseguir voltar para casa, eu mal sabia o caminho.      
- Você é bem teimosa. Vem eu te levo para casa e não precisa ficar com medo, não sou nenhum psicopata. – Ele riu.
Fui caminhando apoiada nele até seu carro, eu queria dizer mais uma vez que não queria ajuda, mas seria tolice continuar insistindo. Ele abriu a porta do carro e me ajudou a sentar, ele parecia bem satisfeito em me ajudar.
Ele começou a dirigir, as ruas estavam silenciosas.
- Qual é o seu endereço?
- Eu não sei. – Eu realmente não sabia, acabará de me mudar e não sabia nem o nome da rua onde morava.
- Assim vai ficar difícil. Me diz algum ponto de referência. 
Pensei por alguns instantes.
- Minha casa é uma branca com portão azul, próxima a uma oficina.
- Ah sei onde fica, é a oficina do Harry o melhor mecânico da cidade, na verdade é o único mecânico que tem aqui, mas ele é ótimo.    
Fiquei aliviada por ele saber, não queria ter que ligar para meu pai.
O carro dele cheirava a hortelã, enquanto ele me levava para casa ficamos em silêncio, apenas observando as ruas escuras e vazias. Eu queria perguntar por que ele resolveu me ajudar, qual era o nome dele e o que ele estava fazendo àquela hora passando por aquele lago, mas optei por ficar quieta e não perguntar nada, pelo menos não naquele momento.
- Pronto chegamos.
Lá estávamos nós na frente da minha casa, peguei minha mochila, saí do carro sem me despedir nem agradecer pela carona e fui em direção a minha casa.
- Ah meu nome é Oliver. Foi um prazer.
Eu o ignorei, continuei caminhando sem olhar para trás. Ele esperou até que eu entrasse em casa e foi embora. As pessoas dali eram bem diferentes de Marvin, eu não estava acostumada com tantas gentilezas, em Marvin as pessoas não se importavam umas com as outras.
Pensei que meu pai estaria na porta me esperando para brigar comigo pelo meu atraso, mas me enganei. Fui até a garagem e seu táxi estava lá, então para ter certeza que ele não estava na delegacia colocando a polícia atrás de mim, fui até seu quarto, ele estava dormindo feito um bebe. Fui para meu quarto, cambaleado ainda, por causa do uísque, fiquei sentada na cama pensando naquele garoto simpático que me trouxe até em casa, os pensamentos foram inevitáveis.


- Triiimmmm. – Tocou o despertador.
- Droga! Maldito despertador! – Falei batendo no despertador.
Me acordei com uma enorme dor de cabeça. Minha vontade era de ficar em casa e ficar dormindo o dia todo, mas eu sabia que meu pai não deixaria, ainda mais depois da noite passada. Quando estava descendo as escadas vi meu pai sentado no sofá, eu já sabia o que estava por vim.
- Onde você estava ontem o dia inteiro? – A voz dele era tão furiosa que me encolhi numa reação inesperada.
- Eu estava conhecendo a cidade. – Falei insegura.
- Não minta pra mim Jéssica! Você bebeu não foi? – Ele aumentará o tom de voz na última frase.
- Não é da sua conta! – Eu também aumentei o tom de voz.
- Eu sou seu pai é da minha conta sim!
- Você nem se preocupa em saber como estou, agora quer saber se bebi ou não, você nem se importa com meus sentimentos!
- Eu me preocupo com você, eu não quero que você saia por ai beber. Você é muito jovem, sua mãe também não iria querer que você bebesse e você sabe disso!
Aquelas palavras doíam e machucavam tanto quanto facadas. Não consegui falar mais nada, sai e bati a porta com toda a força que encontrei. Eu não estava com a mínima vontade de ir para a escola depois daquela discussão, queria comprar mais uma garrafa de uísque e voltar para aquele lago, mas meu dinheiro havia acabado, mas mesmo sem o uísque fui até o lago, como na véspera sentei à beira e meus pensamentos foram longe, no passado mais uma vez e mais uma vez as lágrimas começaram a cair. Eu sabia que meu pai tinha razão, minha mãe jamais aprovaria que eu bebesse tão jovem, mas se ela estivesse viva tudo seria diferente, eu precisava de alguém com quem conversar desabafar e pedir conselhos. Minha mãe era minha melhor amiga e sem ela eu fiquei sem rumo, eu precisava dela.
Depois de um tempo sentada à beira do lago, fiquei com fome e lembrei que estava sem comer desde o café da manhã de ontem. Decidi voltar para casa, provavelmente meu pai já havia saído para trabalhar, então eu não corria o risco de ter que discutir com ele de novo. Cheguei em casa e como previ meu pai não estava mais lá. Preparei um sanduíche, dei ração para Cristal, fui até a sala e coloquei um filme qualquer para assistir, depois peguei Cristal no colo.
- Ai Cristal que saudade da mamãe, você também deve estar com saudade dela né? – Comecei a falar com Cristal, pelo menos acho que ela me entendia, o único problema era que ela não me respondia.
- Lembra Cristal de quando ela levava nós duas no parque? De quando ela nos contava histórias? – Eu ainda tinha esperança de Cristal me responder. Fiquei tagarelando com Cristal durante o filme.  
Quando o filme acabou fui para meu quarto e fiquei ouvindo música, acabei ficando com sono e então dormi, muito mais cedo do que de costume. Quando me acordei de manhã, encontrei um prato com um pedaço de bolo de chocolate e um copo de leite encima da minha escrivaninha. Pedir desculpas não era típico do meu pai, mas aquele pedaço de bolo e aquele copo de leite era a maneira dele pedir desculpas. Me arrumei, comi o bolo e tomei o leite, fui para o ponto de ônibus cedo de mais e então tive que ficar esperando por um longo tempo até que o ônibus chegasse, quando entrei no ônibus mais uma vez todos os olhares se voltaram em minha direção, naquele momento eu desejei poder ler pensamentos.
Cheguei na escola e fui direto para a sala de aula. A garota tagarela que sentava ao meu lado ainda não havia chegado, na verdade eu era a única dentro da sala. Depois de alguns minutos sozinha, chegou o garoto que me levou para casa, Oliver, desviei o olhar quando ele olhou para mim. Quando voltei o olhar para porta, tomei um susto, ele estava parado ao meu lado.
- Você não me disse seu nome. – Falou ele ao meu lado.
- Meu nome é Jéssica. – Eu estava terminando de dizer meu nome e o sinal da escola tocou. Os outros alunos começaram a chegar e um garoto ruivo e gordinho puxou Oliver antes que ele pudesse falar mais alguma coisa.
A garota que se sentava ao meu lado foi uma das últimas a entrar na sala.
- A professora pediu para te entregar, já que você não veio na aula ontem, é para estudar o capítulo 13. – Falou ela me entregando um livro de química.
Peguei o livro, ela ficou olhando pra mim, provavelmente esperando que eu a agradecesse, mas nada falei então ela se virou com mau humor. A aula de matemática estava tão chata que quase dormi. Quando tocou o sinal de que a aula acabou, suspirei satisfeita. Resolvi não pegar o ônibus para ir para casa, eu precisava voltar para aquele lago, aquele lugar me trazia lembranças de minha mãe e era um ótimo lugar para ficar sozinha. Quando sai da escola, um carro parou do meu lado, por um segundo pensei ser meu pai, mas quando olhei vi que era o mesmo carro que me levou pra casa.
- Posso te dar uma carona? - Falei comigo mesma o que será que aquele garoto queria comigo.
- Não. – Respondi.
- Vamos você sabe que não sou nenhum psicopata.
Eu estava prestes a dizer não novamente, mas eu queria saber o que ele estava fazendo naquela noite que passou naquele lago e porque se preocupou em me levar para casa, então entrei no carro, alguns alunos que passavam por nós ficaram olhando.
- E então, te levo para casa de novo?
- Não vou ir para casa, vou ir para o lago.
- Está bem então. Levando mais uma garrafa de uísque?
- É dá sua conta?!
- Nossa mocinha, você não gostou mesmo de mim né?
Não respondi.
- Vou entender isso com um sim. – Ele fez uma cara de triste ao falar isso.
- Me diz o que você estava fazendo aquela noite tão tarde passando por aquele lago e porque se preocupou em me ajudar e me levar para a casa? – Perguntei.
- Eu estava indo na casa de minha tia e quando vi você jogada no chão, parei o carro e fui correndo ver se você estava bem.
A resposta dele parecia bem convincente, mas ainda faltavam perguntas.
- Mas porque me ofereceu carona hoje? Eu acho que já deixei bem claro que não quero fazer amizades!
Ele precisou de um tempinho para responder.
- Eu gostei do seu jeito, você é diferente de todas as garotas daqui, só achei que poderíamos ser amigos, desculpa.
Me senti um monstro, minhas palavras haviam magoado ele.
- Olha eu não sou o tipo de pessoa que consegue ter amigos. – Tentei justificar meu comportamento.
- Você já tentou?  
Parecia que ele me conhecia a tempo.
- Acho que... não. – Gaguejei.
- Então porque não tentar agora?
Fiquei sem resposta. Eu queria alguém para conversar, para me dar conselhos, pra me ajudar quando eu precisasse, mas para mim a única pessoa capaz disso era minha mãe, não conseguia pensar em mais ninguém que pudesse preencher o lugar dela como amiga em minha vida.
Ficamos em silêncio até chegarmos no lago.
- Posso ficar aqui com você?
Pelo jeito ele realmente queria minha amizade.
- Eu sei que se eu disser que não você vai ficar do mesmo jeito.
- É você ta certa – Ele falou sorrindo.
Ficamos observando o lago, o sol que refletia na água era encantador.
- Você morava aonde mesmo Jéssica?
- Em Marvin.
- E você venho pra cá com seu pai e sua mãe?
Não consegui responder de imediato.
 -Minha mãe... Morreu – As palavras saíram rasgando minha garganta.  A expressão no rosto dele mudou.
- Me desculpe, eu não sabia me desculpe ter perguntado isso.
- Está tudo bem. Eu nunca falei sobre isso com ninguém, mas acho que está na hora de eu falar.
- Se não quiser não precisa me falar nada.
Eu queria falar, mas ao mesmo tempo não queria. Engoli em seco.
- Eu preciso falar. – Respirei fundo antes de continuar. – Minha mãe morreu quando eu tinha nove anos... ela era minha melhor amiga, eu não fazia nada antes de perguntar para ela, ela me entendia, ao lado dela eu me sentia segura, quando ela morreu foi como se tivessem arrancado meus braços e minhas pernas... Eu não consigo me relacionar muito bem com as pessoas, eu sinto muito a falta dela, ás vezes me lembro dos momentos em que passamos juntas e choro, me isolo do mundo... eu gosto de beber, o álcool ameniza a dor da falta dela. – Comecei a chorar. Oliver pegou em minha mão e eu o abracei. Nos braços dele me senti segura, como eu me sentia quando estava nos braços de minha mãe.
Continuei – Acho que meu pai quis se mudar pra cá porque Marvin trazia muitas lembranças de minha mãe... desde quando cheguei aqui estou tentando fazer as coisas darem certo, mas está muito difícil...  
- A gente se conhece há muito pouco tempo, mas quero que saiba que estou aqui para ser seu amigo e estar do seu lado.
Eu ainda estava abraçada nele, era tão bom aquele abraço que eu não queria mais sair dali.
- Obrigada... amigo. – Finalmente consegui me soltar. Olhei para ele e ele estava sorrindo.
Depois de tantos anos eu encontrei coragem de ser amiga de alguém. Eu me senti feliz ao lado dele. Ficamos conversando durante horas, ele era muito engraçado e me divertia. A tarde passou tão rápido que eu nem percebi.
- Nossa são 5 horas, quer que eu te leve pra casa agora?
- Nossa a tarde passou rápido de mais. Claro se você quiser me levar. – Eu não queria abusar da bondade dele.
- Vamos então.
No caminho até minha casa liguei o rádio do carro dele, cantamos juntos Smells Like Teen Spirit do Nirvana. Não demorou muito até chegarmos em minha casa.
- Muito obrigado pela carona – Agradeci diferente da outra vez.
- De nada, até amanhã na escola.
-Até.   
Quando cheguei em casa meu pai estava olhando TV.
- Onde você estava Jéssica?
Eu estava de tão bom humor, que respondi com a maior vontade:
- Eu saí com um colega, às pessoas daqui são realmente muito simpáticas.
Ele pareceu acreditar.
- Que bom que está fazendo amizades. Comprei pizza pra gente, você a prepara?
- Claro.
Fui até a cozinha e coloquei a pizza no forno. 
Antes de dormir não consegui parar de pensar naquela tarde com Oliver, foi muito divertido.

terça-feira, 5 de junho de 2012

1. Mudança



Meu nome é Jéssica Wanter, minha mãe morreu num incêndio na empresa onde trabalhava quando eu tinha nove anos, então passei a morar com meu pai Eduardo Wanter, um motorista de táxi baixinho e careca, apesar dele ser um ótimo pai, muito autoritário e intrometido, porém um ótimo pai, sinto muita falta de minha mãe, que era minha melhor amiga e sempre estava do meu lado para me segurar caso eu caísse, um tempo depois da morte dela tentei cometer suicídio, cortando os pulsos, mas minha tentativa foi em vão, meu pai chegou a tempo de me levar para o hospital. As cicatrizes são evidentes, ás vezes olho para elas e fico pensando se não seria melhor meu pai ter deixado que eu me matasse. Normalmente uso roupas pretas, do tênis às calcinhas, até meu cabelo é preto, por mais ridículo que possa parecer, o fato de eu usar muita roupa preta sempre desagradou meu pai e sempre foi combustível para várias brigas, mas ele sabe que comecei a usar só roupas pretas depois da morte de minha mãe, é uma maneira de me expressar.      
Sinto-me muito sozinha, minha única amiga é Cristal gatinha que ganhei de presente da minha mãe. Tenho problemas com alcoolismo, bebo pra me desconectar do mundo real, meu pai não gosta que eu beba, ele já tentou me internar numa clínica de reabilitação, mas convenci-o de que eu ia parar de beber, evidentemente menti e ele sabe disso, então mantenho minhas garrafas de vodka e meus litros de vinho escondidos misturados com minhas roupas bagunçadas em meu guarda-roupa.
Meu pai me obrigou a sair da cidade onde sempre morei Marvin para ir morar numa cidade chamada Bela Rosa, o nome da cidade já não me agradou.
Neste momento estamos á caminho da tal cidadezinha, não me sinto muito confortável andando no táxi do meu pai, um péssimo dia para estar chovendo.
- E então Jéssica animada pra conhecer a nova casa? – Meu pai falou com grande entusiasmo.
- Claro pai. – Menti, com um sorriso amarelo.
- Não se preocupe estamos chegando já, tenho certeza que você vai gostar, a casa é bem espaçosa e seu quarto tem uma vista linda. – O entusiasmo parecia ter aumentado no tom de voz dele.
- Tenho certeza que vou gostar pai. – Menti de novo.
Pude sentir no olhar dele que ele sabia que eu estava mentindo. O relacionamento com meu pai andava muito conturbado, as brigas entre nós estavam ficando constantes e então naquele momento decidi que não era hora nem lugar para discutir sobre a mudança.


Meu pai parou o carro, eu estava quase dormindo no banco do carona.         
- Finalmente chegamos, a casa é está branca bem aqui. E então o que está achando por enquanto? - Olhei para casa branca, com um portão azul meio enferrujado e com flores cor de rosa num pequeno quintal na frente e menti mais uma vez:
- Nossa pai, é realmente.... linda. – Fingi estar animada.
- Que bom que você gostou Jéssica, fico muito feliz em saber disso. – Os olhos dele brilhavam ao dizer isso, ele realmente estava muito feliz com aquilo, com a mudança, com a casa nova, novos vizinhos acho que na verdade ele estava tentando viver uma vida nova, por isso resolveu se mudar, tentar esquecer o passado com minha mãe.
Ficamos esperando o caminhão com nossas coisas chegar. Enquanto isso fui olhar a casa para meu pai realmente achar que eu estava animada. A casa realmente tinha muito espaço, era bem maior do que a casa onde morávamos em Marvin, meu pai mostrou aonde seria meu quarto, fingi estar animada de novo:
- Abra está porta Jéssica, este será seu quarto. – Nem tive tempo de abrir a porta, ele mesmo abriu antes que eu pudesse chegar perto dela.
- Realmente muito.... espaçoso pai. – Gaguejei por não conseguir achar a palavra certa para descrever aquele cômodo vazio.
- Olha que linda está vista. – Disse ele olhando pela janela.
- Muito linda mesmo pai, adorei. –Murmurei ao lado dele olhando pela janela também. Naquele momento ouvimos o caminhão da mudança chegar. Meu pai desceu as escadas e eu fui logo atrás dele para ajudar a tirar nossos móveis do caminhão e colocar na casa.

Quando chegou a noite já tínhamos organizado uma boa parte dos móveis, mas ainda faltava muita coisa para ser colocada no lugar, mas àquela hora da noite tanto eu como meu pai estávamos exaustos. Subi para meu quarto e fiquei olhando pela janela, à noite a vista era muita mais bonita, o céu estava estrelado e a lua encantava qualquer um que olhasse para ela. Como eu não tinha muito tempo com meu pai nos últimos anos resolvi descer e ficar um pouco com ele. Quando cheguei até a sala lá estava ele olhando um filme de terror, seu tipo de filme preferido, isso tínhamos em comum.
- Então pai, será que posso assistir o filme com você ou este filme é assustador de mais pra mim? – Eu falei tentando ser engraçada.  
- Claro que pode Jéssica, o filme tem uns zumbis assustadores, mas acho que isso não te assustaria. – Ele tinha razão.
- Há, há, há, há... – Rimos ao mesmo tempo. 
- Vou fazer algumas pipocas para nós. - Falei quando as risadas cessaram. 
Fui até a cozinha que estava uma bagunça, demorei para achar o sacode pipocas. Enquanto colocava as pipocas para estourar me perdi em pensamentos. Aquele cheirinho de pipoca me fez lembrar da época em que minha mãe fazia pipocas e eu ficava em volta dela, com o olhar atento a tudo que ela fazia, quando me dei conta, uma lágrima começava a cair de meus olhos lacrimejantes. Imediatamente limpei meus olhos na manga do meu moletom e coloquei as pipocas que já estavam queimando em uma vasilha, temperei-as com sal e voltei para sala.
- Elas ficaram um pouco queimadas. –Alertei entregando a vasilha de pipocas para meu pai.
- Hum. Estão ótimas. – Ele falou com a boca cheia de pipocas.
- Sr. Eduardo não te ensinaram que é feio falar de boca cheia não? – Ele sorriu.


- Jéssica acorda! – Disse meu pai cutucando meu braço. Acabei pegando no sono no meio do filme.
- Droga! Não acredito que dormi e perdi a melhor parte do filme. – Realmente eu estava cansada para ter dormido em meio a um filme de terror.
Meu pai e eu bocejamos quase que na mesma hora.
- Acho que está na hora de nós dois irmos para cama.
 Olhei para o relógio já eram 2 horas, bocejei mais uma vez: - Verdade. Quero me acordar cedo para procurar algum emprego.
- Você sabe que não precisa trabalhar, eu ganho o suficiente para nos sustentar. – Meu pai alterou a voz.
Eu mantive a calma, não queria brigar com ele e estragar o resto daquela noite que até então estava sendo maravilhosa, normalmente motivos menores e mais idiotas do que este era motivo de briga entre nós.
- Pai, eu só quero trabalhar para comprar algumas coisas de que preciso, não quero depender do seu dinheiro.
Meu pai sabia que tipo de coisas eu queria comprar, mas acho que naquele momento ele também queria evitar uma briga.
- Está bem, mas procure um emprego perto de casa, não quero você muito longe, não se esqueça ainda somos novos nesta cidade e não conhecemos muito por aqui.
- Pode deixar. – Assenti satisfeita por ele não ter me dado um sermão de meia hora sobre alcoolismo.
Peguei Cristal que estava dormindo no canto do sofá e fui em direção ao meu quarto, quando estava subindo as escadas, meu pai me surpreendeu.
- Boa noite Jéssica – Meu pai me desejando boa noite? Isso não era muito comum. Sempre quem me desejava boa noite quando eu era criança era minha mãe, ela nunca deixava eu ir dormir sem um beijinho de boa noite.
Depois de alguns segundos finalmente consegui responder: - Boa noite pai.
Subi as escadas para meu quarto, com Cristal no colo. Deitei na cama e em segundos adormeci.